Ação protocolada pela Funai tramitava no Supremo desde 1982.
Conflitos entre índios e fazendeiros motivaram inclusão do tema na pauta.
Por sete votos a um, o
Supremo Tribunal Federal
anulou títulos de propriedades de áreas particulares que estejam dentro
dos 54 mil hectares da reserva Caramuru Catarina-Paraguaçu. O terreno
foi demarcado entre 1926 e 1938, mas nunca foi homologado.
A decisão permite a manutenção de indígenas pataxós hã-hã-hães em
terras de fazendas que estão dentro da reserva, localizada no sul do
estado da Bahia. A
ação
foi protocolada pela Funai há 30 anos, e o julgamento só foi concluído
nesta quarta-feira (2). Em 2008, o ministro Eros Grau - então relator,
hoje aposentado - votou de forma favorável à declaração de nulidade dos
títulos. O julgamento por um pedido de vista do ministro Carlos Alberto
Menezes Direito, morto em 2009.
O resultado do julgamento não prevê a expulsão imediata dos não-índios
da região, apenas a anulação dos títulos. Também não houve decisão
acerca da possibilidade de indenização aos produtores que vivem na
região e que terão de deixar a terra - ambos os temas devem ficar a
cargo da União, com a execução da sentença sendo acompanhada pelo
ministro Luiz Fux.
O ministro Carlos Ayres Britto, no entanto, disse que, em tese, as
indenizações só poderiam se referir a benfeitorias produzidas pelos
moradores da região, e não às propriedades. "Por efeito dos títulos não,
pela nulidade dos títulos não. Só pelas benfeitorias de boa fé, mas
essa questão da boa fé tem que ser provada", afirmou
"Nós estamos afirmando: determinada área do território é indígena. As
propriedades tituladas, em parte, estão dentro desta área indígena.
Sobre estes títulos, referentes a propriedades situadas na área
indígena, recai a direta declaração de nulidade", explicou o presidente
do tribunal, ministro Carlos Ayres Britto.
Lágrimas e sangue
A ação só voltou agora a julgamento por insistência da ministra Cármen
Lúcia. Ela pediu, no começo de abril deste ano, a inclusão com urgência
do processo na pauta do Supremo, o que não ocorreu.
Um novo pedido foi feito nesta quarta-feira (2). A ministra lembrou do
agravamento dos conflitos entre índios e fazendeiros na região. "São
volumes de lágrimas, sangue e mortes", alegou. Com a concordância dos
demais ministros - exceção feita ao ministro Marco Aurélio Mello, que se
queixou do acréscimo do tema "de surpresa" - a ação foi incluída na
pauta.
Cármen Lúcia concordou com o entendimento de Eros Grau, e defendeu a
anulação da propriedade de 186 áreas, que afetam três municípios: Itaju
do Colônia, Pau
Brasil
e Camacã. "Julgo procedente a ação, acompanhando o relator, para
declarar a nulidade dos títulos de propriedade referentes a imóveis no
interior da área demarcada e comprovada nessa ação, totalizando 54 mil
hectares", votou a ministra.
A ministra discordou de argumentos de que os índios tenham abandonado a
região. "Há de se reconhecer afastamento de algumas áreas, mas eles
nunca abandonaram a região e as violências contra eles teriam conduzido
este afastamento", afirmou a ministra.
A concordância com o voto da ministra foi quase unânime em relação à
anulação dos títulos de áreas incluídas na reserva: o ministro Marco
Aurélio Mello foi o único voto contrário. "Não posso colocar em segundo
plano os inúmeros títulos formalizados tendo como partes da relação
jurídica que se mostrou harmônica, formalizados pelo estado da Bahia com
os particulares. Confiaram os particulares no estado da Bahia e
adentraram a área que não era ocupada por indígenas e passaram a
explorar essas áreas", afirmou o ministro.
Já o presidente do tribunal defendeu a medida."A terra para os índios é
um totem horizontal, um espírito protetor, mantendo com o índio uma
relação umbilical. Por isso que a Constituição proíbe a remoção do
índio", afirmou o ministro Ayres Britto.
Definida a situação das áreas que estão dentro dos limites da reserva,
houve uma discussão técnica em relação aos réus cujos títulos sejam
externos à área demarcada. A interpretação vencedora garantiu que a
medida não afeta as propriedades externas à região demarcada.
O ministro Dias Toffoli se declarou impedido de participar do
julgamento, por ter atuado como Advogado-Geral da União no caso. O
ministro Luiz Fux, que substituiu Eros Grau, também não votou. Já os
ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski não participaram da
sessão.
Prouni e mensalão
A pauta original prevista para a sessão desta quarta-feira incluída
dois temas polêmicos. Um era a ação que contestava a constitucionalidade
do Prouni, o programa do governo federal que concede bolsas de ensino
superior. Entre os pontos contestados estava a adoção de cotas sociais e
raciais pelo projeto.
Outro item da pauta era uma questão de ordem do ministro Joaquim
Barbosa acerca do rito de julgamento do inquérito do mensalão. A análise
dos dois temas foi adiada devido à inclusão da ação acerca da reserva
indígena na Bahia.
A previsão do presidente do tribunal, ministro Ayres Britto, é de que o
Prouni seja tratado na sessão marcada para a quinta-feira (3). Já a
questão de ordem acerca do mensalão só deve ser analisada pelos
ministros na próxima semana.
Fonte: http://g1.globo.com/politica/noticia/2012/05/stf-anula-titulos-de-fazendas-em-reserva-indigena-da-bahia.html
Graças a resistência, a perseverança e a bravura destes que são os
verdadeiros donos da terra, enfim foi feito justiça. Torcemos para que
estes invasores reconheçam o direito à propriedade dos índios e os
deixem viver em paz. Parabêns ao STF pela sábia decisão!